A caça de javali pelo público CAC (Caçador, Atirador e Colecionador) chegou ao STF (Supremo Tribunal Federal), e pode estar perto do fim no estado de Santa Catarina —em âmbito nacional, é incerto se a atividade será avaliada pela corte.
O caso gira em torno da lei estadual 18.817/2023, do estado catarinense, que autoriza a caça do javali-europeu estratégia de controle populacional da espécie invasora.
O Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal questionou a constitucionalidade da norma, alegando que ela abre brecha para a caça esportiva, o que é vedado pela legislação federal brasileira.
A ação foi protocolada como uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) e está sob relatoria do ministro Kassio Nunes Marques, que é CAC.
O juiz já pediu informações à Assembleia Legislativa catarinense. A expectativa é de que o julgamento ocorra diretamente no mérito, ou seja, sem necessidade de análise prévia de liminares.
Ação no STF pode trazer fim da caça em SC, mas não deve alterar regulamentação federal, diz jurista
“Isso não deve afetar a regulamentação federal da caça”, diz o advogado e pesquisador de segurança pública Fabricio Rebelo, em vídeo sobre o tema divulgado em seu canal no Youtube. “Apenas essa lei cairia. A regulamentação não sofreria alterações, em tese”.
“O risco é que neste julgamento, como infelizmente vem se tornando habitual no ambito do STF, além do enfrentamento da questão que foi efetivamente trazida pela ADI, o Supremo fixe alguma tese hermenêutica constitucional”, diz.
Nesse caso, a ação não se limitaria ao objeto no qual ela foi calcada, e pode ganhar uma repercussão geral”, afirma. “É provável que isso aconteça? Eu acho que neste momento, e com a relatoria de Nunes Marques, não”.
Segundo o jurista, também “não há nenhuma perspectiva de que isso seja julgado de modo rápido”, de acordo com os ritos estabelecidos pelo relator.
O que está em jogo?
Apesar de parecer uma disputa entre ambientalistas e caçadores, o debate traz à tona questões técnicas e jurídicas relevantes, inclusive para profissionais e entusiastas da indústria de armas:
- Competência legislativa: A Constituição Federal atribui à União a competência para legislar sobre caça, fauna e meio ambiente. Estados podem apenas suplementar essas normas, desde que não contrariem as diretrizes federais. O Fórum argumenta que Santa Catarina extrapolou seus limites ao criar uma regra própria para autorizar o manejo por abate.
- Natureza da atividade: O STF vai precisar analisar se a lei catarinense, na prática, permite apenas o manejo ambiental – como forma de controle de uma espécie exótica e nociva à biodiversidade – ou se abre margem para a caça esportiva, prática proibida no Brasil desde 1967, pela Lei de Proteção à Fauna (Lei 5.197/67).
- O que diz o fórum: A entidade autora da ação menciona investigações conduzidas por Ibama e Polícia Militar Ambiental que identificaram criadouros clandestinos de javalis, inclusive em áreas de preservação permanente (APPs). Segundo os autos, esses espaços serviriam como “reservas de caça”, indicando que o propósito da lei poderia estar sendo desvirtuado.
Caso o STF entenda que a lei catarinense é inconstitucional, poderá restringir a atuação de caçadores autorizados, inclusive os que hoje atuam legalmente com autorização federal.
Por outro lado, se a norma for mantida, pode abrir espaço para outras legislações estaduais sobre controle de fauna invasora — o que interessa pode impactar fazendeiros, clubes de tiro e fabricantes de equipamentos de caça.
O que esperar do julgamento?
Ainda não há data definida para o julgamento. O processo está na fase de instrução, e o ministro Kassio Nunes Marques aguarda manifestações da Assembleia Legislativa de Santa Catarina e de outros órgãos técnicos.
Quando for julgado, o STF deverá definir até que ponto o controle de espécies invasoras pode ser feito por meio da caça com armas de fogo, e se essa regulamentação cabe aos estados ou exclusivamente à União.
Em meio ao aumento da presença do javali em áreas agrícolas e à demanda por mais segurança no campo, o julgamento será acompanhado com atenção tanto por ambientalistas quanto por representantes do setor armamentista. A decisão poderá estabelecer novos limites para o uso legal da caça como ferramenta de manejo no país.