
O TJSP (Tribunal de Justiça de São Paulo) decidiu, por unanimidade, que não há proibição legal de publicidade de armas de fogo na internet ou em redes sociais, desde que as empresas sigam as regras do Estatuto do Desarmamento e do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar).
O julgamento, ocorrido em 28 de outubro de 2025, na 27ª Câmara de Direito Privado do tribunal reformou uma sentença que havia determinado à Taurus Armas a retirada de publicidades de suas plataformas digitais.
Na prática, a decisão abre precedente para o setor e reconhece a legalidade da presença online das fabricantes, desde que o conteúdo não incentive o “uso indiscriminado de armas de fogo”.
“A publicidade de armas não é vedada em absoluto”, afirmou o relator, desembargador Dario Gayoso. Segundo ele, o que a lei proíbe é apenas a divulgação que “estimule o uso indiscriminado de armas de fogo, nas publicações não especializadas”, o que não se aplicava ao caso da Taurus, segundo o juiz.
Ao THE GUN TRADE, o presidente da Aniam (Associação Nacional das Indústrias de Armas e Munições) e CEO da Taurus, Salesio Nuhs, disse que “a decisão é muito importante para segmento, pois dá legimidade do uso de redes sociais a todos, desde que observadas as recomendações do Conar”, diz.
Relembre o caso
A ação civil pública havia sido proposta por um conjunto de organizações da sociedade civil — entre elas a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, o IDEC e o Instituto Sou da Paz — sob a alegação de que a publicidade online da Taurus nas redes violava a legislação e incentivava a cultura de violência, o que foi aceito pelo TJSP em primeira instância.
O grupo pedia a proibição definitiva de campanhas de marketing sobre armas, multa de R$ 1,5 milhão e indenização por danos morais coletivos. À época, o tribunal pediu a remoção das postagens da Taurus nas redes sociais, mas rejeitou o pedido de multa.
O colegiado então deu provimento ao recurso da Taurus para afastar o pedido de proibição do uso pela fabricante, de seu site e redes sociais; e negou provimento ao recurso das autoras que pediam a reforma da sentença para condenação da empresa em danos morais coletivos e aplicação de multa administrativa.
Segundo a empresa, “ajudou nesse julgamento a mudança de composição da Turma Julgadora, formada pelos desembargadores Dario Gayoso (relator), Marcello Perino e Daise Fajardo. Esses dois últimos não compunham a turma julgadora anterior. O relator já tinha posicionamento que indicava voto favorável à empresa. Os outros dois foram enfáticos em acompanhá-lo e recomendar o acórdão para jurisprudência”.
Responsabilidade é do Conar, diz relator
O relator destacou que as regras do Conar são suficientes para coibir abusos e que “a obediência às disposições do Conselho Regulamentador é suficiente para inibir eventual abuso”.
Ele também afirmou que obrigar a empresa a se restringir apenas a revistas especializadas “contraria o próprio dispositivo legal que autoriza a publicidade em qualquer meio de comunicação, mediante fiscalização”.
Sobre a alegação de que menores poderiam ser expostos ao conteúdo, o acórdão lembrou que o Estatuto da Criança e do Adolescente apenas veda publicidade de armas em publicações destinadas ao público infantojuvenil — não na internet em geral.
“Não há impedimento legal para que as publicações […] relacionadas com armas de fogo possam também ser divulgadas pela internet, bastando que obedeçam às regras do Conselho Regulamentador”, escreveu o desembargador Dario Gayoso.
Competência é do Exército, diz TJSP
O TJSP também afastou o pedido de multa e indenização.
Segundo o voto, apenas o Exército Brasileiro tem competência para fiscalizar e aplicar sanções administrativas nesse tipo de caso.
“Não compete ao Poder Judiciário extrapolar os comandos da lei e interferir na esfera de competência dos demais poderes”, diz o acórdão, citando o princípio da separação dos poderes”.
O tribunal ainda concluiu que não houve dano moral coletivo, pois as publicações analisadas “não incitam a violência, sendo descritivas dos produtos, apontando tecnologias utilizadas e ressaltando qualidade e segurança”.
Decisão pode ter efeito maior
Embora a decisão tenha sido proferida em processo específico, ela consolida uma interpretação favorável ao setor de armamentos, reconhecendo que a publicidade de armas é permitida no Brasil — inclusive nas redes sociais — desde que não viole as diretrizes do Conar nem estimule uso indevido.
Por envolver a aplicação de normas gerais (Lei 10.826/03 e Decreto 11.615/2023), o entendimento pode servir de referência para outros casos e fabricantes, e pode ser citado em novos julgamentos sobre publicidade do setor.